Lugar de solidão

Deitada na penumbra, a tua respiração adormecida de encontro ao meu peito. Inspiro uma e outra vez este cheiro tão teu, tão nosso, quero preservar para sempre este momento. O mundo a acontecer lá fora, nós a permanecermos aqui. No escuro, onde ninguém sabe. Onde ninguém vê. Eu, tu, os meus medos.

Passeio os dedos pelo teu cabelo transpirado e tento sacudir a ansiedade que se instalou. Quando é que me tornei nesta pessoa insegura? As pressões para não falhar e sentir que o faço a cada instante. Gostas de mim assim, ainda que tão imperfeita? Fica só mais um pouco, apenas o suficiente para conquistarmos a eternidade. Deslizo o meu corpo cansado para mais perto do teu e arrumo-me entre os lençóis, o teu respirar sossega os meus anseios. 

Vamos lado a lado de mão dada, perguntas-me para onde. Para onde quiseres, respondo, e continuamos a andar. Para onde quiseres. Devolves-me o sorriso quando o teu olhar encontra o meu e inundas-me daquela felicidade repentina que dura uns minutos apenas, mas que consegue silenciar o tanto que tenho para resolver em mim e a completa incapacidade para o fazer. 

A criança franzina e tímida, com medo do escuro, a noite que parecia feita para a engolir. As exigências, as obrigações, a imposição de uma perfeição que não chega nunca, os gritos, a falta de respeito, de empatia, a desvalorização, o não ser suficiente, o não prestar para nada, as feridas que não saram nunca, os gritos, sempre os gritos. É só uma criança, está tão escuro e ela ficou sozinha, com medo e danificada para o resto da vida.

Quando o cansaço se instala e a raiva e a frustração e o medo e a culpa. Choro muito e em silêncio, choro quando ninguém está a ver, choro para dentro, choro por mim, por ti, pelo que somos e pelo que podíamos ser, choro a sentir-me fraca e cobarde e irremediável. Toda a gente sabe que um homem não chora, mas as mulheres também não. 

O tempo tem pressa. A vida não espera por mim, mesmo quando não estou preparada para a enfrentar. Um dia estes braços, que hoje são a tua casa, vão ficar vazios. 

A maternidade é um lugar de solidão.

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