Mais um ano, pai


Esta data. Apenas uns dias antes do teu aniversário. Aquele vigésimo quarto que, por qualquer razão obscura, não te deixaram celebrar. Durante muito tempo tive medo, sabes. Medo de uma maldição invisível, de coincidências, da chamada fatalidade. Como se já não bastassem todos estes anos de existência sem te ter conhecido.

A minha mãe nunca te esqueceu, sabes. Depois deste tempo todo posso afirmar, sem medo de errar, que nunca haverá outro homem para ela. Que me lembro de a ouvir dizer que ainda está apaixonada por ti. Afinal de contas, foste o único que a fez mudar de ideias e ter um filho. Uma filha. Não foi bonito que, sete meses depois, as tenhas deixado sozinhas.

Gostava de pensar que, nestes últimos anos, te tornaste amigo da avó. Ela pode contar-te muito sobre mim, sabes. Em alturas destas, quero acreditar no céu, tal e qual como ela me ensinou. Se não é lá que vocês andam, não imagino onde mais possa ser.

Ainda não tenho bem a certeza de quem sou, pai. Acho que parte de mim vai andar sempre à tua procura, sabes. Parece que a adoração vem de longe, daquele tempo em que bastava pores a chave na fechadura para toda eu espernear de contentamento no berço. Hoje ainda sou essa criança, à espera, sempre à espera, que me venhas abraçar.

Comentários

  1. Miúda fizeste-me ficar emocionada!
    Sempre soube que te expressavas muito bem pela escrita, mas desta vez consegui mesmo sentir e visualizar os acontecimentos e os sentimentos que foste descrevendo!
    És uma rapariga muito forte que admiro muito!
    Parabéns pelo texto e, principalmente, parabéns por conseguires transmitir tão bem o que te vai na alma!
    Beijinhos

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  2. Wow, magnifico. Fiquei sem palavras e com um no na garganta. Pulga.

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